januaria e helena

sábado, janeiro 28, 2006

José

JOSÉ

E agora, José?
A festa acabou,
a luz apagou,
o povo sumiu,
a noite esfriou,
e agora, José?
e agora, Você?
Você que é sem nome,
que zomba dos outros,
Você que faz versos,
que ama,
protesta?
e agora, José?

Está sem mulher,
está sem discurso,
está sem carinho,
já não pode beber,
já não pode fumar,
cuspir já não pode,
a noite esfriou,
o dia não veio,
o bonde não veio,
o riso não veio,
não veio a utopia
e tudo acabou
e tudo fugiu
e tudo mofou,
e agora, José?

E agora, José?
sua doce palavra,
seu instante de febre,
sua gula e jejum,
sua biblioteca,
sua lavra de ouro,
seu terno de vidro,
sua incoerência,
seu ódio, - e agora?

Com a chave na mão
quer abrir a porta,
não existe porta;
quer morrer no mar,
mas o mar secou;
quer ir para Minas,
Minas não há mais.
José, e agora?

Se você gritasse,
se você gemesse,
se você tocasse,
a valsa vienense,
se você dormisse,
se você cansasse,
se você morresse...
Mas você não morre,
você é duro, José!

Sozinho no escuro
qual bicho-do-mato,
sem teogonia,
sem parede nua
para se encostar,
sem cavalo preto
que fuja do galope,
você marcha, José!
José, para onde?

Carlos Drummond de Andrade

quarta-feira, janeiro 25, 2006

desaparecimentos

Desaparecimento de Luísa Porto

Pede-se a quem souber
do paradeiro de Luísa Porto
avise sua residência
à Rua Santos Óleos, 48.
Previna urgente
solitária mãe enferma
entrevada há longos anos
erma de seus cuidados. Pede-se a quem avistar
Luísa Porto, de 37 anos,
que apareça, que escreva, que mande dizer
onde está.
Suplica-se ao repórter-amador,
ao caixeiro, ao mata-mosquitos, ao transeunte,
a qualquer do povo e da classe média,
até mesmo aos senhores ricos,
que tenham pena de mãe aflita
e lhe restituam a filha volatilizada
ou pelo menos dêem informações.
É alta, magra,
morena, rosto penugento, dentes alvos,
sinal de nascença junto ao olho esquerdo,
levemente estrábica.
Vestidinho simples. Óculos.
Sumida há três meses.
Mãe entrevada chamando.
Roga-se ao povo caritativo desta cidade
que tome em consideração um caso de família
digno de simpatia especial.
Luísa é de bom gênio, correta,
meiga, trabalhadora, religiosa.
Foi fazer compras na feira da praça.
Não voltou.
Levava pouco dinheiro na bolsa.
(Procurem Luísa.)
De ordinário não se demorava.
(Procurem Luísa.)
Namorado isso não tinha.
(Procurem. Procurem.)
Faz tanta falta.
Se, todavia, não a encontrarem
nem por isso deixem de procurar
com obstinação e confiança que Deus sempre recompensa
e talvez encontrem.
Mãe, viúva pobre, não perde a esperança.
Luísa ia pouco à cidade
e aqui no bairro é onde melhor pode ser pesquisada.
Sua melhor amiga, depois da mãe enferma,
é Rita Santana, costureira, moça desimpedida,
a qual não dá notícia nenhuma,
limitando-se a responder: Não sei.
O que não deixa de ser esquisito.
Somem tantas pessoas anualmente
numa cidade como o Rio de Janeiro
que talvez Luísa Porto jamais seja encontrada.
Uma vez, em 1898ou 9,
sumiu o próprio chefe de polícia
que saíra à tarde para uma volta no Largo do Rocio
e até hoje.
A mãe de Luísa, então jovem,
leu no Diário Mercantil,
ficou pasma.O jornal embrulhado na memória.
Mal sabia ela que o casamento curto, a viuvez,
a pobreza, a paralisia, o queixume
seriam, na vida, seu lote
e que sua única filha, afável posto que estrábica,
se diluiria sem explicação.
Pela última vez e em nome de Deus
todo-poderoso e cheio de misericórdia
procurem a moça, procurem essa que se chama Luísa Porto
e é sem namorado.
Esqueçam a luta política,
ponham de lado preocupações comerciais,
percam um pouco de tempo indagando,
inquirindo, remexendo.
Não se arrependerão. Não
há gratificação maior do que o sorriso
de mãe em festa
e a paz íntima
conseqüente às boas e desinteressadas ações,
puro orvalho de alma.
Não me venham dizer que Luísa suicidou-se.
O santo lume da fé
ardeu sempre em sua alma
que pertence a Deus e a Teresinha do Menino Jesus.
Ela não se matou.
Procurem-na.
Tampouco foi vítima de desastre
que a polícia ignora
e os jornais não deram.
Está viva para consolo de uma entrevada
e triunfo geral do amor materno,
filial
e do próximo.
Nada de insinuações quanto à moça casta
e que não tinha, não tinha namorado.
Algo de extraordinário terá acontecido,
terremoto, chegada de rei,
as ruas mudaram de rumo,
para que demore tanto, é noite.
Mas há de voltar, espontânea
ou trazida por mão benigna,
o olhar desviado e terno, canção.
A qualquer hora do dia ou da noite
quem a encontrar avise a Rua Santos Óleos.
Não tem telefone.
Tem uma empregada velha que apanha o recado
e tomará providências.
Mas
se acharem que a sorte dos povos é mais importante
e que não devemos atentar nas dores individuais,
se fecharem ouvidos a este apelo de campainha,
não faz mal, insultem a mãe de Luísa,
virem a página:
Deus terá compaixão da abandonada e da ausente,
erguerá a enferma, e os membros perclusos
já se desatam em forma de busca.
Deus lhe dirá:
Vai,
procura tua filha, beija-a e fecha-a para sempre em teu coração.
Ou talvez não seja preciso esse favor divino.
A mãe de Luísa (somos pecadores)
sabe-se indigna de tamanha graça.
E resta a espera, que sempre é um dom.
Sim, os extraviados um dia regressam
ou nunca, ou pode ser, ou ontem.
E de pensar realizamos.
Quer apenas sua filhinha
que numa tarde remota de Cachoeiro
acabou de nascer e cheira a leite,
a cólica, a lágrima.
Já não interessa a descrição do corpo
nem esta, perdoem, fotografia,
disfarces de realidade mais intensa
e que anúncio algum proverá.
Cessem pesquisas, rádios, calai-vos.
Calma de flores abrindo
no canteiro azul
onde desabrocham seios e uma forma de virgem
intata nos tempos.
E de sentir compreendemos.
Já não adianta procurar
minha querida filha Luísa
que enquanto vagueio pelas cinzas do mundo
com inúteis pés fixados, enquanto sofro
e sofrendo me solto e me recomponho
e torno a viver e ando,
está inerte
cravada no centro da estrela invisível
Amor.

(Em Reunião - 1969)

Carlos Drummond de Andrade

sábado, janeiro 21, 2006

vamos a votos

Amanhã vamos votar! Bora lá! Votem em quem mais gostarem OK

gatices

A francelina esteve com o cio e já que não a deixei ir à rua, caiu um gato no terraço. É verdade! E que lindo gatão que aqui caiu. Todo preto com os olhos verdes. O problema foi tirá-lo de cá de casa e o cheirinho que por cá ficou. Se vai haver gatitos daqui a uns meses não sei, não vi nem ouvi nada
Estou grávida ou não?! Sei lá, vai ali a passar uma coisita p'ra brincar...

A francelina pensa... ai sou tão bela, e tão fotogénica...

As gatitas brincam

As gatitas comem e que lindos cobertores que nós temos

quinta-feira, janeiro 12, 2006

OS MALUCOS

Maluco empurrou homem para a linha de comboio, provocando-lhe a morte.

Ponham os loucos no manicómio, os assassinos na prisão. Já que imitamos a Europa em tudo, porquê acabar com os locais específicos para doentes mentais? Que eu saiba na Europa esses locais existem. Para os loucos terem direitos os sãos perdem-nos. E digamos que os loucos os perdem também. Num hospital especializado, geralmente situados em locais sossegados e com uma moldura vegetal, com médicos e pessoal específico, devem ser melhor tratados e recuperar a lucidez mais rapidamente. Mas isto, tal como tantas outras coisas, é a minha maneira de ver o mundo, parece que completamente em desacordo com os sucessivos governos que de há uns anos para cá legislam este país à beira mar plantado.

O ANJO

Recebi hoje um mail muito giro com a história dum bébé que estava prestes a nascer, e, transmitia a ideia que cá na terra havia um anjo que lhe ensinava tudo, e que de tudo o protegia. Esse anjo chamava-se mãe.
Sou mãe e não sou anjo. Quantas vezes, após uma introspecção concluo que agi de maneira errada, talvez da pior maneira...
Parem de inventar que as mães são perfeitas. Não sou, não somos, nem somos obrigadas a ser.

ÁGUA

Os portugueses andam a beber água com arsénio. Já nem sei de quando são as análises mas que não são deste mês, ai isso não são. E aí é que o assunto me preocupa. Depois de estarmos todos envenenados, somos então informados, oficialmente. Neste país acontece tudo a posteriori.

A VACA ESFOMEADA

Mais uma história do Mário

Era uma vez uma vaca que tinha muita fome. Quando foi pastar comeu, comeu, comeu tanto que parecia um corta relva, e saltou para comer as folhas das árvores. No Outono as folhas já nem precisavam cair das árvores.
Essa vaca, quando parou de comer, o seu dono viu que ela era a melhor de todas as vacas porque estava muito gorda.
No final do dia a vaca foi para o estábulo. O dono disse à sua mulher que ia matar a vaca e vender a pele e a carne também.
Ouvindo isto a vaca vomitou tudo o que tinha comido.
O dono no dia seguinte abriu o estábulo e lá estava a vaca, mas agora só pele e osso.
O dono decidiu matá-la na mesma e aproveitar a pele para fazer um casaco de pele de vaca.

(Mário - 9 anos)

quarta-feira, janeiro 11, 2006

A DEFESA DAS CRIANÇAS

De vez em quando vem à baila uma história de crianças mal tratadas e agredidas pelos próprios familiares. Há pouco tempo a mãe duma miúda suicidou-se num poço. Outras atiram-se para um precipício com os filhos e tudo. Cortam o mal pela raiz.
Os comentários que oiço são sempre os mesmos. Porque não dão os filhos para adoção. Não são pais nem são nada. E por aí adiante. Sempre me contive de fazer suspeições. Somos todos diferentes em enfrentar a vida. E quem sabe o que se passa nessas famílias?
Há pouco tempo soube dum rapaz que vive com a mãe num casebre, sem água canalizada e luz eléctrica. Não é porque a mãe não trabalha, nem para ter um Mercedes à porta. Afinal é a vida que para uns é mãe e para outros madrasta.

A REFORMA

Uma das notícias que tem enchido os noticiários é que daqui a 10 anos não haverá dinheiro para pagar as reformas. Onde é que isto vai parar...
Até quando ficamos impávidos e serenos a ver e ouvir tanta idiotice. Ver delapidar o dinheiro dos impostos em viagens, ordenados chorudos para amigos etc. etc. (que gastava muito tempo em tentar enumerar os que me lembrasse). Cheira-me que será mais uma desculpa para umas leis que irão beneficiar meia dúzia e piorar a situação dos que já estão mal. Até quando vamos perdendo os direitos adquiridos, alguns ainda antes do 25 de Abril??
Noutro dia por causa duma multa e do respectivo autuado, dizia ele, que os pobres estão sempre mal. E sem dúvida que tinha razão.

ano novo vida nova

Ena! Há quanto tempo eu não escrevia nada por aqui. Isto está a ficar um deserto.
E quem inventou essa treta de que ano novo vida nova, devia estar a tentar enganar o ceguinho. Pois, nem tenho tido vontade de escrever. Continua tudo na mesma. Mesmo assim sempre me anima pensar que há pessoas a quem a vida corre bem e para essas, e já com algum atraso, desejo um ano 2006 pleno de realizações.